24 de mai. de 2007

Sob as luzes de Argos(Javier di Mayr-abá)


Medidas

O cálice da luz
Tem que ser sorvido
Em pequenos goles,
A despeito da sede
E das luzes.

Só quem chega ao fundo do poço
Sabe a exata distância
Que o separa da superfície.
A escuridão existe
Para medir a intensidade da luz
Que não lhe coube sê-la.

Castanheiras

Esperei-te séculos!
Ergui-me viçosa e bela
até que apareceste
com ares senhoriais.
Eu sempre pensei
nosso sexo
assim mesmo:
sem nexo.

Mas essa motoserra
foi demais.

Infâncias

O mundo fez piruetas
com o pé de manga-rosa
pintou as bolas-de-gude
com as sobras do arco-íris.
Brincavam de amarelinhas
felizes muricizeiros.
Curiós, xexéus e sanhaços
faziam o maior furdunço
nas frutas, nos arvoredos.

Os anos de todos eles
a gente contava nos dedos.

Com argamassa dos sonhos,
a terra forjava os homens:
era Bruno, Erick, Carol e Rafa
brincando de lobisomem.

Auto tessitura

Habitam em mim
duendes e ninfas
que se embalam
ao som das águas
dos igarapés e rios...
Sonhando com os mares
sabem das enchentes e vazantes;
deduzem marés e preamar.
Brotam dos meus olhos
a alegria da luz
do nascer do dia
e a tristeza de não-sei-bem-onde
adornada pelo vôo das gaivotas
e andorinhas nos finais de tarde
a povoar meus olhos.
Coexisto escárnio e mistério;
convivo a cada segundo
com a hipótese do fim;
em cada curva
gume da afiada lâmina
a esperar por mim.
Meus líquidos – mel e fel,
são taças a inundar-me os leitos.
As dores, na carne ínvia,
Agem ambíguas em viagens e lendas.
- Os sons roubam-me a cena.

É sempre assim!
Sou tantos nessa moldura de carne e ossos...
A música que me habita
ronda em minha mesa
farta de canções impossíveis.
Olho o horizonte
e tento resumir o céu
aos pedaços que alcançam minhas retinas.
Os dias parecem-me tão curtos
já não me bastam;
sou pouco demais para mim mesmo!
Talvez porque ainda procuro rumos
em minhas velas enfunadas.
O tempo é um novelo:
nem novo, nem velho,
basta-se a si mesmo.
É só tempo, a esmo,
sem antagonismos... sem dilemas...
O mundo que nos rodeia
é um abismo de sorriso largo
e o reino fugidio do sonho
não contém a magia do passo que decide.
Os sonhos são mais caprichosos
que a musa que amei.


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